A dificuldade nas relações sociais é uma característica marcante do TEA (APA, 2014) e isso tem um impacto direto na relação terapêutica com esta população. Construir um relacionamento com clientes autistas pode ser desafiador devido aos interesses limitados dessa população e comportamentos disruptivos.
Muitas vezes há um nível desafiador de demandas quando o terapeuta não está sensível a criança e não respeita seus limites, o que acaba resultando em um provável histórico aversivo de terapias ABA (Rajaraman et al. 2022).
Uma maneira de construir um bom relacionamento é através do Pairing. O Pairing é considerado uma intervenção antecedente, já que é realizada antes da ocorrência do comportamento interferente, diminuindo a aversividade do procedimento para o terapeuta e para o cliente Pairing é uma intervenção baseada no antecedente para reduzir comportamentos interferentes e aumentar o controle instrucional (Sundberg & Partington, 1998). Carbone et al. (2007) descrevem que a intervenção baseada em estímulos antecedentes pode ser usada para eliminar a natureza aversiva dos contextos terapêuticos.
O Pairing é uma das formas de estabelecer um bom rapport na terapia, consistindo no processo do terapeuta se parear com estímulos reforçadores (Lugo, 2018). Sundberg e Partington (1998) descrevem o Pairing como uma estratégia para estabelecer o terapeuta como reforçador condicionado. Esse processo se refere a formação inicial do vínculo terapêutico quando paciente e terapeuta estão se conhecendo. Após o estabelecimento do vínculo inicial, é importante que este vínculo seja mantido, e uma das maneiras descritas na literatura é o pre session pairing, como uma manutenção do vínculo terapêutico. Os dois procedimentos têm como objetivo em comum tornar a presença do terapeuta em um estímulo discriminativo que sinalize a disponibilidade de diversos estímulos reforçadores no ambiente.
É de extrema importância que a criança esteja feliz, engajada e demonstre que de fato quer estar naquele espaço de terapia antes de começar a fazer atividades e responder às demandas. Por esses motivos, Barbera (2007) descreve o processo de Pairing como uma forma de aproximação. No início do processo terapêutico, os terapeutas devem ter diversos reforçadores potentes disponíveis para começar os atendimentos, devem ir em direção ao cliente e simplesmente entregá-los, sem que essa entrega seja contingente a nenhuma resposta específica. Esse é um processo que o terapeuta deve se mostrar como alguém confiável e ter bons resultados na terapia.
O Pairing deve se manter na terapia de forma frequente, como uma maneira de garantir que o terapeuta continue se pareando a estímulos reforçadores, como uma manutenção da relação terapêutica. O ritmo e o tempo do processo de Pairing são sempre determinados pelo próprio cliente, apenas quando a criança confiar no terapeuta e demonstrar estar engajada, feliz e confortável podemos dizer que o Pairing foi realizado de forma eficaz.
Diversas pesquisas destacam a vantagem do Pairing na diminuição de comportamentos interferentes ao desenvolver um ambiente terapêutico reforçador para o cliente (e.g., Ensor, 2015; Kelly et al., 2015; Carbone et al. 2007; Lugo et al, 2017, 2018; Shilingsburg et al. 2014, 2019; Sundberg & Partington, 1998). Um dos principais resultados do Pairing é a diminuição da fuga de demandas, pois ele torna o processo terapêutico e as demandas apresentadas em contingências de reforço positivo, nas quais a atenção do terapeuta é o próprio estímulo reforçador positivo. Um processo terapêutico que não leva em consideração a relação com a criança pode produzir um contexto terapêutico aversivo, no qual a criança se comporta para produzir a remoção da demanda, logo, por reforço negativo. Nesse sentido, o Pairing serve como operação abolidora para o comportamento desafiador mantido por atenção ou mantido por fuga durante a instrução (Kelly et al., 2015).
Muitas intervenções são possíveis no campo dos procedimentos e intervenções comportamentais, o que deve ser ponderado, no ponto de vista ético – e humano -, é se esses procedimentos fazem sentido e se são adequados com os valores de uma intervenção compassiva. A falta de assentimento dentro do contexto terapêutico com clientes autistas não pode ser normalizada.
O Pairing é uma das estratégias que respeita o indivíduo através do próprio vínculo com o terapeuta. O profissional se torna sensível e fica sob controle das motivações do seu cliente, as colocando como base para qualquer tomada de decisão nas suas intervenções.
REFERÊNCIAS
American Psychiatric Association (2014). Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (5ª ed.). Artmed.
Barbera, M. L. (2007). The verbal behavior approach: How to teach children with autism and related disorders. Jessica Kingsley Publishers.
Carbone, V. J., Morgenstern, B., Zecchin-Tirri, G., & Kolberg, L. (2007). The role of the reflexive conditioned motivating operation (CMO-R) during discrete trial instruction of children with autism. Journal of Early and Intensive Behavior Intervention, 4(4), 658.
Ensor, R. D. (2019).
The Impact of Pairing on Therapeutic Rapport and Treatment Outcomes for Children with Autism. Dissertação (mestrado), Faculty of Social Sciences, Brock University.
Kelly, A. N., Axe, J. B., Allen, R. F., & Maguire, R. W. (2015).
Effects of presession pairing on the challenging behavior and academic responding of children with autism. Behavioral Interventions, 30(2), 135-156.
Lugo, A. M., King, M. L., Lamphere, J. C., & McArdle, P. E. (2017).
Developing Procedures to Improve Therapist-Child Rapport in Early Intervention. Behavior Analysis in Practice, 10(4).
Lugo, A. M., McArdle, P. E., King, M. L., Lamphere, J. C., Peck, J. A., & Beck, H. J. (2019).
Effects of presession pairing on preference for therapeutic conditions and challenging behavior. Behavior Analysis in Practice, 12(1), 188-193.
Rajaraman, A., Austin, J. L., Gover, H. C., Cammilleri, A. P., Donnelly, D. R., & Hanley, G. P. (2022).
Toward trauma‐informed applications of behavior analysis. Journal of Applied Behavior Analysis, 55(1), 40-61.
Shillingsburg, M. A., Bowen, C. N., & Shapiro, S. K. (2014).
Increasing social approach and decreasing social avoidance in children with autism spectrum disorder during discrete trial training. Research in Autism Spectrum Disorders, 8(11), 1443-1453.
Shillingsburg, M. A., Hansen, B., & Wright, M. (2019).
Rapport building and instructional fading prior to discrete trial instruction: Moving from child-led play to intensive teaching. Behavior Modification, 43(2), 288-306.
Sundberg, M. L., & Partington, J. W. (1998).
Teaching language to children with autism and other developmental disabilities. AVB Press.